REFLEXÃO SOBRE O TRABALHO DA AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS NA ATUAL GESTÃO

 

Tenho 21 anos de atuação na gestão de recursos hídricos, apenas um ano a mais da implantação da política nacional de recursos hídricos. Neste período de aprendizado, troca de experiências e conhecimentos, tive o privilégio de conviver com pessoas qualificadas, abnegadas e compromissadas com a causa. E, com certeza precisaria de um grande espaço para relacioná-las nesta singela homenagem. Permitam-me, então, reportar, neste momento, aos que fazem a atual diretoria da Agência Nacional de Águas, nas pessoas de Vicente Andreu (Diretor-Presidente), João Gilberto Lotufo, Paulo Varela, Ney Maranhão, Gisela Damm e Ricardo Medeiros, pela grande contribuição que deram a gestão dos recursos hídricos no Brasil, notadamente com o apoio da valorosa colaboração técnica da equipe que compõe essa Agência, dos órgãos gestores estaduais e dos colegiados (conselhos e comitês de bacias hidrográficas).

Neste sentido, destaco entre as muitas ações desenvolvidas, àquelas que a meu ver tiveram maior impacto: Progestão, Capacitação para a gestão da água, Interáguas, Produtor de Água, Procomitês, Projeto Legado, Prodes, Monitor de Secas, Fórum Mundial da Água; como também total transparência de acesso as informações, estudos e publicação com destaque para o Atlas de Abastecimento de Água e o Atlas do Saneamento Básico, fortalecimento dos instrumentos de gestão da água, aprimoramento do monitoramento com a implantação das salas de situação, dos diálogos permanentes com os atores envolvidos na gestão de crise dos rios São Francisco, Paraíba do Sul e Tocantins, culminando com a imensurável contribuição para a gestão de risco a partir da proposta que dispõe sobre as condições para a operação do Sistema Hídrico do Rio São Francisco (grifo nosso), de grande relevância para gestão dos recursos hídricos do Brasil.

Aos que chegam, aproveito o momento para deixar registrado alguns desafios: a) Incluir a comunicação, fiscalização e monitoramento como instrumentos de gestão; b) Integrar a gestão das águas superficiais com águas subterrâneas (irmãs siamesas) e as políticas setoriais; c) Estabelecer as vazões de entrega do rio São Francisco; d) Dar uma maior atenção a oferta da água, notadamente na preservação e recuperação das áreas de recarga dos nossos mananciais; e) Maior atenção nas bacias hidrográficas em crise recorrentes, minimizando o efeito nefasto da dupla dominialidade f) Aprimorar a governança com ampliação do diálogo permanente, entendendo GOVERNANÇA como uma nova geração de reformas administrativas e de Estado, que têm como objeto a ação conjunta, levada a efeito de forma eficaz, transparente e compartilhada, pelo Estado, pelas empresas e pela sociedade civil, visando uma solução inovadora dos problemas sociais e criando possibilidades e chances de um desenvolvimento futuro sustentável para todos os participantes; g) A participação dos municípios nos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos e nos Comitês de Bacia deve ser fortalecida, dado seu papel chave no uso e ocupação do solo, gestão de resíduos, licenciamento ambiental local e saneamento; h) Fortalecer institucionalmente os órgão gestores estaduais, entre outros.

Com relação a este último item (h), chamo a atenção que a Carta Magna de 1988, conhecida por todos nós como cidadã e municipalista, fortaleceu os municípios (transferindo o ônus e não o bônus) que apresentam na sua quase totalidade baixa capacidade técnica e fragilizou os estados, que inclusive deixaram de planejar, transformando a gestão pública no Brasil num caos com tendência a piorar (aliás este modelo de pacto federativo é único no mundo), chegando a comprometer o funcionamento e o bom desempenho das agências reguladoras de serviços, com exceção daquelas agências que regulam o bem natural, a exemplo da ANA (água) e ANP (petróleo).

Neste cenário, medida provisória está sendo preparada para que a ANA assuma a regulação dos serviços do saneamento básico, que sob o meu ponto de vista irá fragilizar a gestão dos recursos hídricos no nosso país, em detrimento da priorização da realização de força tarefa para equacionar o grande passivo daquele setor (saneamento básico), já que culturalmente temos uma tendência de acharmos que os nossos problemas são facilmente resolvidos pela engenharia civil (obras) em detrimento da governança (capital humano)?!

Sabemos que o domínio público da água não transforma o Poder Público Federal e Estadual em proprietário da água, mas o torna gestor desse bem, no interesse de todos e que, descontinuidades nas lideranças e representantes de alto escalão em órgãos públicos, sejam eles federais ou estaduais e comitês, causam sérios danos a qualquer processo de reforço das instituições de gestão da água.

Portanto aos que estão saindo, Vicente Andreu, João Gilberto Lotufo, Paulo Varela e Gisela Damm nossos parabéns e muito obrigado. Aos que ficam Ney Maranhão e Ricardo Medeiros, e aos que chegam boa sorte e sucesso, na esperança de que não devemos retroceder. Para isto devemos todos estar atentos e fortes, pois verás que um bom filho teu não foge à luta, BRASIL.

Ailton Francisco da Rocha[1]

[1] Engenheiro Agrônomo, Advogado, Escritor e Superintendente de Recursos Hídricos da SEMARH/SE.

 

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