Realidade e desafios dos Comitês na gestão futura da água

Artigo da Secretaria Executiva do Consórcio PCJ*

Estamos nos aproximando do XX Encontro Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas (ENCOB). Florianópolis (SC) foi a cidade escolhida para sediar esta edição, que será realizada entre os dias 20 e 24 de agosto de 2018. O evento comemora a terceira década da Política Nacional de Recursos Hídricos, promulgada em 08 de janeiro de 1997. Mas o que temos a comemorar? Quais são os desafios a enfrentar?

 Com a criação da PNRH surgiram os Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs), responsáveis por promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e articular a atuação das entidades intervenientes; arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos; aprovar e acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia, sugerindo providências necessárias ao cumprimento de suas metas; estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; dentre outras atribuições previstas na Lei nº 9.433/97.

Desde a criação dos comitês de bacias, várias conquistas foram alcançadas, por meio da implementação dos instrumentos de gestão dos recursos hídricos. Até o final de 2016 foram elaborados 164 planos de bacias estaduais (ANA, 2017), que contemplam estudos técnicos para diagnóstico da bacia, regras para o uso da água, prioridades para investimentos, e que podem, inclusive, conter propostas para o reenquadramento dos corpos d’água, como é o caso do Plano das Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (Bacias PCJ).

Nas Bacias PCJ, cuja população total ultrapassa 5,5 milhões de habitantes, a execução do plano permitiu diversos avanços para a região. Para exemplificar, o tratamento de esgotos na bacia como um todo saltou de 3% para 76%, e o índice de perdas na distribuição, que inicialmente era superior a 50%, hoje é de 34%. Os mais de 320 milhões de reais obtidos com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos desde 2006 propiciaram o investimento em diversos projetos, não somente estruturais, mas também de recuperação das nascentes e de educação ambiental. Tais investimentos propiciaram o reenquadramento de trechos do Rio Jundiaí, de classe 4 para classe 3, permitindo assim a utilização de suas águas para o abastecimento público.

Embora seja importante festejar as conquistas, não podemos esquecer que o sistema de gerenciamento dos recursos hídricos precisará enfrentar inúmeros desafios nos próximos anos. Apesar de existirem 232 comitês, considerando os estaduais (223) e os interestaduais (9), apenas 49% da população brasileira vive em áreas sob atuação de algum CBH (ANA, 2017). Além de não abranger toda a população brasileira, um dos problemas enfrentados atualmente pelos órgãos colegiados é a baixa participação dos usuários, principalmente de organizações da sociedade civil, que não acreditam no poder articulador dos comitês.

Outra preocupação é a ocorrência cada vez maior dos eventos climáticos extremos, que podem estar relacionados ao aumento da temperatura global. Pesquisas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU apontam uma relação entre o aumento da temperatura da superfície do mar e uma maior ocorrência de tempestades e furacões. Outros estudos também demonstram uma possível relação entre o aumento da temperatura e a distribuição das precipitações pelo planeta.

Nas Bacias PCJ, por exemplo, são observados em média 1.500 mm de chuvas no ano, mas até o mês de julho de 2018 o acumulado não passou de 544 mm. Esse fenômeno climático de escassez de precipitações tem sido acompanhado pelos técnicos do Consórcio PCJ desde o ano passado, quando a média anual já ficou abaixo do esperado, em torno de 1.306 mm, o que levou a entidade emitir um alerta em janeiro sobre a possibilidade de atravessarmos uma estiagem mais severa nesse ano.

De acordo com o último Relatório da Situação das Bacias PCJ (Agência PCJ, 2017), a disponibilidade de água superficial já é bastante limitada (990,92 m3/hab./ano). Como agravante, existe ainda uma tendência de contínua diminuição da quantidade de água disponível por habitante, que já é considerada insatisfatória em face dos valores de referência adotados para os Relatórios de Situação no Estado de São Paulo.

Nesse contexto, a revisão do Plano das Bacias PCJ, que já está em andamento, prevê a elaboração de um caderno temático especialmente dedicado à garantia de suprimento hídrico, que deverá considerar a ocorrência dos eventos climáticos extremos. Espera-se, portanto, que sejam colocados em discussão recomendações, ações e investimentos a serem realizados para melhorar a segurança hídrica da região.

Acreditamos que o conhecimento adquirido pelas Bacias PCJ com a atual revisão do plano deverá ser amplamente divulgado aos demais comitês existentes, principalmente durante as atividades previstas no ENCOB. Esperamos, assim, trocar experiências e contribuir com o aumento da resiliência dos CBHs aos eventos extremos, que devem estar preparados para enfrentar os novos desafios da terceira década da PNRH.

Referências bibliográficas:

AGÊNCIA PCJ. Relatório da Situação dos Recursos Hídricos 2017: UGRHI 05 Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Versão simplificada, ano base 2016. Piracicaba: Agência PCJ, 2017. 79 p.

ANA – AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (BRASIL). Conjuntura dos recursos hídricos no Brasil 2017: relatório pleno. Brasília: ANA, 2017. 169p.

BRASIL. LEI Nº 9.433, DE 08 DE JANEIRO DE 1997. Política Nacional de Recursos Hídricos. Brasília: DF, 1997.

*Secretaria Executiva do Consórcio PCJ – O Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí é uma associação de direito privado sem fins lucrativos, composta por municípios e empresas, que tem como objetivo a recuperação dos mananciais de sua área de abrangência. O Consórcio PCJ tem como objetivo a gestão e recuperação dos recursos hídricos, através da integração regional, tendo como base de seu trabalho a sensibilização ambiental em todos os setores da sociedade sobre a problemática dos recursos hídricos da região.Essas ações estão divididas em 10 programas de atuação que tem como foco o planejamento, fomento e sensibilização. A entidade tem como Missão promover ações para preservar e recuperar os recursos hídricos das Bacias PCJ e sua Visão é tornar-se uma entidade modelo em gestão dos recursos hídricos por bacia hidrográfica.

Fonte: http://agua.org.br/ – [email protected]

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